Impressões sobre Campina Grande


Eneida Beraldi Ribeiro
Laboratório de Estudos sobre a Intolerância
Universidade de São Paulo


A cidade de Campina Grande, no interior da Paraíba, apresenta, durante o período de carnaval, quando a maioria da população nordestina, brasileira e muitos estrangeiros se dedicam às brincadeiras típicas desta época, trios elétricos, frevos e bailes, uma característica diversa. Há dezesseis anos, me contava o artista plástico, político, historiador e folclorista Chico Pereira, a cidade organiza eventos voltados à discussão de assuntos científicos, como ecologia, meio ambiente e avanços tecnológicos. Os encontros patrocinados pela prefeitura chamaram a atenção da população, que aos poucos, foi desenvolvendo eventos paralelos.
Os religiosos cedo ganharam destaque. Assim, foram se organizando encontros de evangélicos, pentecostais e católicos. Também despertaram interesse os assuntos ligados à ufologia, bruxaria, etc. A cidade recebe um grande número de turistas para as sessões, chegando a totalizar um milhão de pessoas nesse período.
Dentre esses eventos destaco os Encontros dos Amigos da Torá que se destinam a procurar e preservar as raízes judaicas de uma parte dessa população que, gradativamente, vai descobrindo seu passado judeu e construindo uma identidade comum.
A comunidade, recém formada, tem a liderança de Davi Meneses, que há pouco tempo descobriu-se marrano e decidiu investigar suas origens. Hoje, convertido e indiscutivelmente crente na religião que abraçou, mantém expectativas de se tornar rabino.
Em 2008, Davi Meneses convidou a professora Anita Novinsky para ser a conferencista do evento. Esta me indicou e, juntas, participamos do II Encontro dos Amigos da Torá. Logo percebemos, entre seus participantes, uma ânsia por informações e conhecimento histórico. Essas pessoas, que já passaram por outras religiões, estabeleceram laços fraternos que os unem nessa trajetória.
A sinagoga, improvisada no que foi o lar da família Meneses, nos recebeu para as celebrações, e mesmo uma pessoa não judia e distante dos ritos, percebe o empenho na adaptação da liturgia à realidade dos novos judeus. O ambiente era de total felicidade. As pessoas mostravam intensa satisfação em participar do culto religioso.
Havia, à época, um esforço em realizar atividades que revertessem em capital necessário para a construção da sede definitiva.
O grupo, constituído de judeus convictos, relatava-nos Davi Meneses, sofre discriminação. Alguns o rotulam de messiânico, acusação veementemente negada. O programa na rádio da cidade propagava os encontros e tentava desfazer os desentendimentos.
A festa na cidade se estende à recém formada comunidade judaica e é impossível ficar imune à hospitalidade, inteligência e sensibilidade de Lourdes Ramalho, Zilma Ferreira e Severino Barbosa, entre tantos.
Entre toque de berrante, música e dança judaicas, o que marcou profundamente foi perceber a persistência na manutenção das raízes culturais e religiosas desse grupo. Assim inseridos, tornam-se agentes de sua história e se definem plenamente satisfeitos. A Paraíba, aos poucos, volta às suas origens.

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